terça-feira, 23 de novembro de 2010

Frase de Efeito (8)


Retirada do texto Bakhtin: A dimensão idealógica e dialógica da linguagem;
Escrito por Solange Jobim e Souza.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Paralém (Anne Crystie)


Paralém
Escrito por Anne Crystie.

Hey! Existir me fez lembrar você ontem. Já era tarde. Se o sol estivesse nascido, não havia se adiantado. Misteriosamente, toda a minha atenção, consciente e inconsciente, volta-se a lamentar saudades suas. Mais surpreendente que o misteriosamente, somente a estúpida facilidade com que me esqueci da sua displicência. Parecia ter recebido notícias suas no minuto anterior. Sua famosa lista de compromissos e sua famigerada distância aparente. Senti-me na sua rotina outra vez. E olha que você não foi o maior dos meus casos.
Eu ocupava o seu tempo e avassalava o seu coração. Via aquelas horas transformadas em eternidade; num amor que nunca morre. Como eu gozava da sua claustrofobia barata, que, receosa de se aproximar inseparavelmente de mim, esfregava-me loucamente, com aquele ar opaco de início de dia num feriado veraneio. Eu nem sonhava em emergir diante de sua audácia. A minha estrutura perversa se satisfazia inteiramente com a sensação da sua imagem. Abafados ou não, bastava-me perceber o seu toque e escutar os seus segredos de liquidificador.
Recordo-me daqueles dedos que, como alfaiates de meia-tigela, pesavam a largura dos meus sentimentos: quanto mais estreitos, mais estremecedor eram. Eu podia esmagar a sua inocência que se disfarçava de ousadia naquele despropositado evento. E eu a comprimia com pés e mãos. Tinha pleno poder sobre si e nenhum sobre mim. A minha barbárie era tanta que escorria-me a fobia de pensamento.
E eu era todas as línguas da galáxia. Línguas e boca. Fugia-me a noção de ser-aí. Experimentava o ser-aqui quando lhe expectava e espectava me pressionar à parede. No jogo, eu estava sempre perdendo. Ganhando os seus pinos e esmaecendo a minha alma.

sábado, 13 de novembro de 2010

A boy running (Anne Crystie)

À ele, não sei bem quem, sei bem onde,
pela recordação/acorda-ação provocada.

Crédito da imagem: Anne Crystie.

A boy running
Escrito por Anne Crystie.

I didn't see a boy running
But I saw the time.

A old man
Sitting on a too old chair.
He didn't see the time either.

Feeling a world:
Its desires
Its surprises
Its identities.

Discovering a secret:
Its years old
Its parents
Its shoes' number.

Living a son:
His firsts frights
His eleventh birthday
His sisters.

Sitting on a chair:
His favorite radio
His nose's hair
His photography.

Tomorrow don't exist!
I didn't see a boy
He either.

This is the present
But, I keep seeing the time.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

5:10 da manhã de uma segunda-feira mal dormida (Anne Crystie)

Crédito da imagem: Anne Crystie.

5:10 da manhã de uma segunda-feira mal dormida
Escrito por Anne Crystie.

Nem sempre as alvoradas parecem tão inóspitas quanto às dos dias que acordam mais cedo no verão.
De lá de longe, no horizonte... Avistava-se ninguém, caro amigo! As folhas eram a única dança carnavalesca que se via descer a avenida. Descompassadas, deixavam que o remoer dos pássaros lhes adentrassem goela abaixo e já se identificavam como extasiadas oriundas da rave de sábado à noite.
Não é manhã de domingo. Mas sabe que estes eventos pós-emergidos nem deixam que eu conte os dias?! Aquelas luzes encantadoras que se aproximam daqui sugerem alimentar-me do tempo eterno; do sono passageiro no tempo eterno; tempo. Dois vivas à imortalidade!
Tudo que eu quis ter quando crescer: a ampulheta do mundo, o controle das horas e mais cama pra dormir. Tempo de folha, de sol; de tempo em tempo.
A claridade já me escurece os olhos. Não os olhos negros da noite. Os olhos alvos da alma, que descansa duas a três horas por dia: quase um/cesto de egoísmo.
Não ver a noite findar é para os fracos. O mistério dos dias, das ampulhetas, dos ponteiros, passa por aqui toda volta; e eu finjo que durmo e não vejo ou vejo e finjo que o dia não amanheceu.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

O medo que há em mim (Sérgio Pessoa Ferro)

Ao autor e parceiro das madrugadas literárias,
pela colaboração, poesia e canção diárias.

Crédito da imagem: Anne Crystie.

O medo que há em mim
Escrito por Sérgio Pessoa Ferro.

O meu medo barato olhos claros
olha pra mim
sem medo.
Eu, carrasco de mim,
[olho pro medo com medo
Ele, lindo moreno claro cabelo castanho
que mexe comigo por todo o tempo
me chama de noite,
[com a voz arrastada pelo ouvido sedento
Mas eu tenho medo de tudo,
[medo do escuro, do tempo
das crianças, minhas filhas,
[berrando pranto e lamento
Eu tenho medo da fome
[medo da gente que fala e não cala
minha fome e barriga.
Sou meio bandida sei que matei gente,
[mas mudei de vida.
Hoje sigo inclinada, empurrada pro mundo
[por um supereu que me leva e me puxa.
Diz o major que sigo por força,
[que sigo por febre ou por comida.
Diz o padre letárgico que sigo por fé,
[que sigo por sangue ou por ser única a saída.
Diz o político corrupto que sigo por vontade,
[que sigo por anseio ou porque decidi e quero.
Mas diz o meu pai, cá em casa, que sigo direita,
[que sigo correta senão perco filho,
[perco família perco tudo o que tenho.
Sigo com medo da morte, com medo da vida
Medo me corroendo
Prometem-me futuro divino, futuro seguro,
[mas não entendo o momento.
Por medo de tudo, do abismo adiante,
[do falso próximo passo
Medo do destino, do juízo moral
Clamo ao moço de olhos claros
[que se valha de mim
e
arranque de vez o medo que há em mim.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Eternamente, infinitamente dentro de mim;


"Eu quero ser possuída por você, pelo seu corpo, pela sua proteção, pelo seu sangue. Me ama! Eu quero que você me ame e fique eternamente me amando dentro de mim. Com sua carne e o seu amor. Eternamente, infinitamente dentro de mim; me envolvendo, me decifrando, me consumindo, me revelando... Como uma tarde dentro do elevador , no verão, voltando da praia e você me abraçou e eu te abracei... E quanto mais eu me entregava, mais nascia o meu desejo, mais sobrava só o desejo, e mais eu te queria sem palavras, sem pensamentos... A vida inteira resumida só no desejo da tua boca dizendo o meu nome, da tua mão conduzindo a minha mão, do teu corpo revelando o meu corpo, como se o mundo fosse pela primeira vez, você o meu ponto de referência nessa cidade".

José Vicente,
em sua peça Os Convalescentes.