Crédito da imagem: Anne Crystie. |
"Às vezes tudo é lágrima e nada faz sentido. Fica outro mundo, outra magia, assento diferente. Bem verdade: eu não sou o que era. Ninguém é o que foi."
Impressionante
como são sete primaveras depois e eu não me reconheço mais. Pareço mais
velha, mais triste. Sou mais só e mais verdadeira. As pessoas passam,
os lugares ficam, as saudades nascem. O tempo nos preenche de vazios, de
nós apertados. E tudo parece sem cor. Tudo é fotografia antiga,
rabisco, filha falando pra mãe que não vê graça. Às vezes tudo é lágrima
e nada faz sentido. Fica outro mundo, outra magia, assento diferente.
Bem verdade: eu não sou o que era. Ninguém é o que foi. Não há ninguém,
estou abandonada. Tem uns e outros, mas não há nada. Cada vez mais
longe, mais curva, mais retrógrada. Doem as costas, cansam as vistas e
as pernas. Não dou mais do que duas. Não doo tanto. Apareço pouco, vez
em nunca. Espaireço e volto. Eterno retorno ao baú do tesouro achado
perdido. Vão-se os copos, os corpos, as mãos. Cada vez mais espaço... Eu
caibo mais. Tudo me cabe, nada me compreende. Despreenchida,
repreendida, sozinha. Dona de muitas flores que eu era... Gente era
canto, era som, encanto. O tempo sempre atrasado, paredes de calendário.
Dias mortos e uma imensidão viva que me alimentava de pesar sem fim.
Vivendo de futuro, de muro, do outro lado. Os verões como sonhos
contemporâneos, extemporâneos. Pressa de viver, de ser, de conhecer-me
em algum motivo. Abraços que não podiam esperar. Hoje são braços e frio.
E sou a mesma plataforma, repleta de um lugar que nunca chega, um trem
que nunca volta, um amor que nunca morre. Não tem praça, não tem lua,
não tem meio. Sentada, cansada. De passagens na bolsa. Muita bagagem,
aquelas poesias, uns frascos de veneno. E eu que nunca morro... Nunca
vou. Nunca voo. Eu que sempre volto, envolta. As mais belas borboletas
de jardim: é assim a que tudo se resume, que tudo reúne.
Dezembro de 2012
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O que eu te falo nunca é o que te falo e sim outra coisa. (Clarice Lispector)