Crédito da imagem: Anne Crystie. |
Eu gosto mesmo é de gente, de ter com gente, de ser com gente. Ser gente das boas, das de caras lisas, daquelas que não escolhem quais dos talheres usar porque não há talheres, há colher. Tenho fetiche na sinceridade, naquilo que é de carne e osso, em gente de verdade. Dá-me um fogo! Fogo que acende a língua, incendeia o coração e, às vezes, queima as ideias... Mas é fogo feito de gente, é fogo maré. Não gosto de alma, dessas brancas, cheias de joias. Elas guardam muitos segredos, muita pobreza. Almas são um grito de desespero, de socorro, de gente querendo vida. O almado é o soldado que deu certo, que perdeu a luta. Ruim mesmo é ser almado, sem sal, sem vida, sem gostos, com aparências. Eu gosto mesmo é de ver aquilo que se é, de ser aquilo que sou, de sentir aquilo que sinto. Abrir as cartas, mostrar o jogo e ganhar sem virar, ganhar lento, de todo dia, de verdade. Gosto de gente pequena; não gosto de gente grande, porque gente grande não é gente! É bom é o beijo na testa, o abraço apertado, as palavras ditas. Isso é ser gente, é dar no couro, é honrar as calças que veste. A casa de gente alma é zen, é caixinha de areia arrumada, é mesóclise e ênclise sem fim. Gente mesmo tem casinha, tem palmeira, tem sabiá, tem cidade pequena e mundo grande. Gente é do nós, é plural, é diverso, multicor. Alma é sem luz, sem brilho, é solo, é do eu, da identidade. E no fim é sempre igual: mais custa pouca gente apanhada pela mão que muitas almas voando!
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O que eu te falo nunca é o que te falo e sim outra coisa. (Clarice Lispector)